O modelo de Pesquisa e Desenvolvimento no Brasil carece de mudanças e de aprimoramento, com a notória necessidade de crescimento da participação do capital privado direto, e também de uma evolução dos mecanismos e ferramentas legais, inclusive com a criação de um cenário mais estimulante a P&D que envolva instituições e pesquisadores.
Ainda há uma grande dependência de incentivos fiscais e tributários estatais, com mecanismos sempre sujeitos aos “humores” políticos, mas é fato que a aproximação de prazos de vigência de alguns desses instrumentos (a exemplo da Lei de Informática), além da pressão pelos mercados interno e externo, venha a abrir novas e mais robustas discussões sobre esse aprimoramento.
Neste sentido veremos instituições de natureza mista (ICT´s), e suas congêneres privadas, a exemplo de alguns países, mais dinâmicas e atrativas, mas este é um ponto futuro e ainda incerto, apesar de inevitável.
Recentemente foi aberto um flanco para essa discussão a partir do Programa “FUTURE-SE”, iniciativa posta em consulta pública pelo Ministério da Educação, e que visa, segundo a pasta, dentre outros objetivos, dar maior autonomia financeira às instituições federais de ensino superior por meio do fomento à captação de recursos próprios e ao empreendedorismo.
Em um primeiro momento o programa enfrentou grande resistência e sofreu críticas, inclusive de natureza ideológica, posto que estamos em um complexo emaranhado político e polarizado, mas acreditamos que uma evolução nesse debate traga boas novas e ferramentas eficientes para o atual modelo de P&D.
Apenas para ilustrar o quanto o nosso atual modelo é dependente dos incentivos estatais, exemplificamos com dados extraídos do documento denominado “Plano Brasil 2022”, editado pela Secretaria de Assunto Estratégicos da Presidência da República em 2010.
Estava ali um plano de metas a ser perseguido e estimulado por políticas públicas, e citava naquela oportunidade que o investimento em P&D era equivalente a 1,22% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, com participação privada de 0,56%, e contrapartida de investimento público na ordem de 0,66%, incluindo incentivos fiscais.
O “Plano Brasil 2022” estabeleceu como meta um patamar 2,5% do PIB (em 2022), com maior participação percentual privada, só que em 2017 verificou-se que esses percentuais estavam praticamente inalterados, com o investimento em P&D representando ainda 1,26% do PIB (0,63% pelo setor público e 0,64 pelo setor privado).
Notamos uma pequena inversão proporcional entre os investimentos público e o privado, porém insignificante, mas que pode ser um indicativo de maior atividade e iniciativa pela indústria privada e oportunidade para a geração de novos projetos, pois não são tão usuais ainda a instituição de unidades próprias de P&D pelas empresas, fortalecendo, portanto, o modelo de "terceirização" da P&D, inclusive por meio dos ICT´s.
O atual cenário, onde se busca uma retomada econômica, e incremento de uma política mais liberal, poderá mexer nessa equação de maneira positiva, pois investir em P&D está relacionado com a capacidade da empresa de ser inovadora, característica cada vez mais exigida pelo mercado, e que proporciona uma base de sustentação para a viabilização de novos projetos, resultando em benefícios econômicos, como a elevação nas vendas e nos lucros.
Teremos algumas demandas significativas porvir, a exemplo do leilão das faixas de frequência do 5G, pela Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, a política de IoT (Internet of Things)[1], recentemente publicada pelo Governo Federal, ações em busca da implementação de Smart Cities[2], que certamente resultarão em muitas demandas em P&D, especialmente para o mercado corporativo, posto que trarão novas possibilidades, até então inexistentes, nos processos de automação e produção.
Especialmente sobre a questão do lançamento da nova tecnologia do 5G, e apesar de ela estar umbilicalmente ligada aos temas que colocamos (IoT e Smart Cities) um elemento preponderante que nos leva a crer no crescimento da demanda por P&D, é justamente a estagnação que atingiu as empresas prestadoras de serviços de telecomunicações, posto que o ARPU (Average Revenue Per User) está em queda e mexe diretamente com o caixa delas.
Pode ser que se vislumbre para o setor a saída de estimular e facilitar a adoção do 5G pelo mercado corporativo, de alto rendimento, a partir do desenvolvimento de novas soluções e aplicações, o que se configura facilmente em novas oportunidades para captação de projetos em P&D. Um exemplo que podemos citar nesse movimento é o do Living Lab instalado recentemente em Campina Grande/Pb, numa parceria tripartite entre o VIRTUS, a TIM e a Nokia[3], denotando-se daí o fortalecimento da tríade SERVIÇO-INFRAESTRUTURA-DESENVOLVEDORES.
Outro exemplo nessa vertente de ação é o Projeto 5G Brasil, capitaneado pelo TELEBRASIL, que vem realizando desde 2017 vários debates sob as temáticas FREQUÊNCIA, INFRAESTRUTURA, PESQUISA, PRÉ-PADRÕES e VERTICAIS, focados no processo de implantação da nova tecnologia.
O fórum conta com a participação de várias entidades, desde as 22 empresas prestadoras de serviços de Telecom associadas ao TELEBRASIL e outras convidadas, a exemplo do INATEL, CETUC, ABINEE e FITEC, e pode ser uma oportunidade para uma ação de implementação da estratégia que ora discutimos.
Ainda sobre o cenário de P&D, em 2012 foi realizado um excelente trabalho no âmbito do Senado Federal, mais precisamente na Comissão de Ciência e Tecnologia daquela casa legislativa, abordando essas questões. O trabalho foi publicado pela Revista Em Discussão[4], e apesar de já possuir mais de 7 anos desde então, recomendamos a sua leitura como complemento a esta análise.
Outro fato que merece atenção é que tivemos recentemente algumas respostas negativas ao nosso modelo de arcabouço legal, especialmente o de fomento à inovação, oriundas da Organização Mundial do Comércio (OMC), acerca da concessão de benefícios fiscais inconsistentes com o regramento internacional, o que obrigou o país a efetuar mudanças na Lei de Informática[5], um dos principais instrumentos de estímulo a P&D. Apesar de não terem sido significativas, a pressão por essa mudança mostrou que temos que nos preocupar inclusive com ações externas.
É fato, por fim, que o atual cenário político, e as diretrizes vindas do Poder Executivo, influenciam sobremaneira a estratégia nacional de P&D, sendo um caminho que possa atenuar as dificuldades a busca por uma modificação da matriz de financiamento, ou então o direcionamento dos esforços para áreas que afiguram-se como mais promissoras e recheadas de recursos, conforme já falamos acima.
O desempenho de novas contratações e projetos estará natural e diretamente ligado ao desempenho da economia nacional, e também ao fato de que os mecanismos que garantem a quase totalidade dos projetos executados e em execução já estão postos e sem novas possibilidades de revisão, pelo menos por enquanto.
Concluímos com a impressão de que, independendo do que se acredite ser o melhor cenário para P&D no Brasil, seja com o modelo de financiamento majoritariamente estatal, por meio de renúncias e/ou fundos, além de investimentos diretos pelo Governo, há que se discutir um novo e mais adequado arcabouço, posto o que vige remonta em alguns aspectos a mais de 20 ou 30 anos, pelo menos.
Há que se evoluir quanto ao modelo, no mesmo sentido dos puros objetivos da P&D, pois a estagnação significa perda de estímulo.
[1] Decreto no 9.854/2019
[4] Revista Em Discussão! - Edição no 12
[5] LEI 13.969/2019
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